A complexidade do nosso mundo pode ser avassaladora: das delicadas formas de flocos de neve aos padrões de movimento de bactérias em uma gota de água, vários fenômenos exibem uma grande engenhosidade.
Mas de onde vem esta complexidade ?
“Emergência”, uma palavra derivada do verbo emergir, vir à tona, é usada para descrever a capacidade de componentes individuais de um sistema maior de trabalharem juntos a fim de dar origem a um comportamento dramático e diverso.
Vórtices de bactérias
Um dos trabalhos recentes feitos por Enkeleida Lushi, da Universidade Brown (EUA), mostrou bactérias formando espontaneamente um vórtex bidirecional dentro de uma gota de água. As bactérias do centro da gota movimentavam-se na direção oposta às das bordas. Nenhuma bactéria escolhia criar o vórtex de forma consciente, por isto este comportamento é chamado de “emergente”.
Uma das características do comportamento emergente é que ele surge de uma forma espontânea, devido a interações geralmente simples entre as partes que constituem o grupo e o ambiente. Não há um “líder” decidindo como o sistema irá se comportar.
Uma das características desconcertantes da emergência é que o fenômeno geralmente não pode ser predito pelo comportamento das partes. Em outras palavras, sistemas emergentes são considerados maiores que a soma de suas partes.
Alguns modelos simplificados, como o dos autômatos celulares, servem para ajudar a compreender o fenômeno da emergência. Alguns modelos incluem a interação entre os elementos do sistema e seu efeito sobre o ambiente.
Emergência, emergência por todos lados
As amebas, nas condições certas, unem-se e formam algo novo: uma meleca que começa a trabalhar como um organismo único. Essa “forma única” é capaz de cobrir mais terreno que as bactérias originais, colocar colônias em locais escolhidos e já mostraram que podem encontrar a saída em labirintos.
O cérebro é outra estrutura que apresenta o fenômeno da emergência. Um neurônio individual, ou mesmo fatias inteiras do cérebro, não tem as mesmas propriedades de um cérebro interconectado. Afete partes do cérebro, e a vítima apresenta uma variação enorme na capacidade cognitiva e física, na personalidade, no humor e, em alguns casos, ocorre perda total de função.
Não só na biologia, como na sociologia aparecem fenômenos emergentes. Um dos mais dramáticos talvez seja a organização da sociedade das formigas. São todas operárias, até mesmo aquela que nós chamamos de rainha – uma operária especializada em colocar ovos.
As necessidades do formigueiro envolvem saúde, segurança e alimentação e, a qualquer momento, 25% das formigas estão dedicadas à limpeza do ninho, 25% à segurança e 50% à busca de alimentos.
As proporções são fixas e, quando uma formiga morre, outra é convertida automaticamente para manter a relação. Esta relação é mantida pelos ferormônios que as formigas emitem: quando uma encontra muitas operárias, ela automaticamente muda de perfil para outro dos menos representados. Este sistema simples de sinais químicos mantém a força de trabalho em equilíbrio não importa o que aconteça coma colônia.
Na física e na matemática, a emergência tem um sentido um pouco diferente da biologia. A migração do micro para o macro, na física, geralmente não resulta em organização, mas em novas propriedades. Alguns átomos, ou até mesmo bilhões de átomos, fluindo por um cano ou por um lago se movimentam de forma aleatória e imprevisível, mas quando certo fluxo é atingido, ele se torna previsível. A dinâmica de fluídos é, de certa forma, uma propriedade emergente de grupos aleatórios de átomos.
Outros aspectos da física em que a emergência aparece são a pressão e volume de substâncias, que é mantida pela interação de grupos de átomos. O campo magnético de ímãs é outro exemplo de emergência – é o resultado do alinhamento espontâneo do momento magnético de bilhões, trilhões de elétrons. E a supercondutividade, bem como a super fluidez, emergem do fluxo cooperativo de elétrons e átomos, respectivamente.
Em uma escala muito maior, a própria estrutura do universo emerge da interação gravitacional das estrelas. E voltando a escalas menores, a combinação de átomos forma moléculas e macromoléculas, com a emergência de estruturas e interações que determinam sua função em biologia molecular, que por sua vez criam a biologia celular.
Ligando os níveis de complexidade
Apesar do comportamento emergente estar em praticamente todos os lugares, esta é uma área nova de pesquisa, e não há uma compreensão profunda sobre ela.
A cada nível de complexidade surgem novas leis, propriedades e fenômenos, o que é problemático para a ciência: as leis e propriedades que descrevem um nível de um sistema complexo não necessariamente explicam outro nível, não importa o quanto eles possam ser conectados. A compreensão da emergência de estruturas de moléculas não permite necessariamente que alguém possa prever a emergência da biologia celular.
Mesmo a análise e modelagem de fenômenos como os vórtices de bactérias, que ajudam a identificar ingredientes necessários para o comportamento emergente, não é suficiente. É preciso encontrar novas formas de pensar sobre a emergência, que ultrapassem os limites da modelagem convencional de sistemas específicos.
Estas novas ferramentas vão nos permitir determinar os princípios unificantes do comportamento emergente, fazendo a conexão entre todos os níveis de complexidade. Este é um dos grandes desafios da ciência atualmente: compreender e utilizar os princípios da emergência.